A nova ordem mundial: o que muda na geopolítica entre EUA, China e Rússia

A imagem representa o novo equilíbrio de poder entre Estados Unidos, China e Rússia. A arte exibe um mapa-múndi em tom sépia ao fundo, simbolizando o cenário global em transformação. Na parte superior, o título “A NOVA ORDEM MUNDIAL” aparece em letras maiúsculas e brancas, destacando o foco geopolítico da matéria. Abaixo, as bandeiras dos três países — EUA, China e Rússia — aparecem lado a lado, simbolizando a disputa por influência política, econômica e militar no século XXI. O subtítulo “O que muda na geopolítica entre EUA, China e Rússia” reforça o tema do artigo, que aborda as tensões e alianças entre essas potências na redefinição do sistema internacional.

POLÍTICAINTERNACIONAL

10/9/2025

Introdução

Desde o início do século XXI, o mundo vem testemunhando uma profunda transformação nas relações de poder entre as grandes potências globais. O equilíbrio geopolítico, antes relativamente estável após o fim da Guerra Fria, vem sendo redesenhado por fatores econômicos, tecnológicos, militares e ideológicos. Estados Unidos, China e Rússia emergem como protagonistas desse processo, cada um buscando ampliar sua influência e garantir sua posição em uma nova ordem mundial marcada pela multipolaridade, pela disputa tecnológica e por tensões estratégicas em várias regiões do planeta.

Este artigo analisa as dinâmicas dessa nova ordem, explorando como EUA, China e Rússia reconfiguram alianças, disputam recursos e moldam narrativas no cenário internacional. Também discute o impacto dessas transformações em áreas como economia, segurança global, energia, diplomacia e tecnologia.

O fim da hegemonia americana ?

Durante décadas, os Estados Unidos exerceram uma hegemonia global inquestionável. Após a queda da União Soviética, a década de 1990 foi marcada pela chamada “pax americana”: uma era em que Washington dominava a economia mundial, as instituições multilaterais e a agenda política global. No entanto, o século XXI trouxe novos desafios que abalaram essa supremacia.

As guerras do Iraque e do Afeganistão drenaram recursos e desgastaram a imagem dos EUA. A crise financeira de 2008 enfraqueceu a confiança no modelo liberal ocidental, e a ascensão da China desafiou o domínio econômico e tecnológico norte-americano. Sob governos como o de Donald Trump e Joe Biden, a política externa dos EUA se voltou para uma postura mais assertiva e protecionista, especialmente diante da concorrência chinesa.

Apesar de ainda manter uma vantagem militar e tecnológica significativa, os EUA enfrentam hoje uma ordem internacional muito mais competitiva e fragmentada, na qual seu papel como “líder do mundo livre” é contestado em várias frentes.

A ascensão da China: o dragão acordou

A China, que há apenas 40 anos possuía uma economia essencialmente agrícola e isolada, tornou-se a segunda maior potência mundial. Seu modelo de desenvolvimento, baseado em forte intervenção estatal, inovação tecnológica e expansão comercial, tem se mostrado altamente eficaz. A Iniciativa do Cinturão e Rota (Belt and Road Initiative — BRI) é um dos símbolos mais claros de sua estratégia global: um ambicioso projeto de infraestrutura e investimentos que conecta a Ásia, a Europa e a África.

No campo tecnológico, empresas chinesas como Huawei, Tencent e BYD rivalizam com gigantes ocidentais. A China também avança em setores estratégicos como inteligência artificial, 5G, biotecnologia e energia limpa. Essa expansão, contudo, é acompanhada de críticas e desconfianças: o Ocidente acusa o governo chinês de práticas autoritárias, espionagem digital e violações de direitos humanos.

No campo militar, o país moderniza suas forças armadas e expande sua presença no Mar do Sul da China, aproximando-se de um status de superpotência militar. Pequim também busca aumentar sua influência em instituições multilaterais e organismos regionais, criando alternativas à ordem liderada pelos EUA.

A Rússia e o retorno ao jogo de poder

A Rússia, herdeira da antiga União Soviética, voltou a desempenhar um papel central na geopolítica global sob o comando de Vladimir Putin. Após um período de retração nos anos 1990, o país apostou em uma política externa assertiva, baseada na defesa de seus interesses estratégicos e na recuperação de sua influência sobre o espaço pós-soviético.

A anexação da Crimeia em 2014, o envolvimento na guerra civil da Síria e o conflito com a Ucrânia iniciado em 2022 são exemplos dessa postura. Embora enfrentando sanções econômicas severas, a Rússia mantém relevância global graças à sua capacidade militar, ao poder energético (principal exportador de gás e petróleo para a Europa e a Ásia) e à sua aliança estratégica com a China.

Moscou busca reposicionar-se como um contrapeso à OTAN e aos EUA, apostando em parcerias com países emergentes, como Índia, Irã e Turquia, e fortalecendo os BRICS como plataforma de contestação à hegemonia ocidental.

Multipolaridade e novas alianças

O cenário atual se caracteriza por uma transição de um sistema unipolar, dominado pelos EUA, para um mundo multipolar, com várias potências exercendo influência em diferentes regiões. Essa transformação cria uma teia complexa de alianças e rivalidades.

Os BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) simbolizam essa tendência. O grupo busca uma ordem internacional mais equilibrada, com instituições financeiras alternativas, como o Novo Banco de Desenvolvimento (NDB), e uma agenda voltada à cooperação Sul-Sul. A recente inclusão de novos membros — como Arábia Saudita, Irã e Egito — amplia seu peso geopolítico.

Ao mesmo tempo, o Ocidente reage. Os EUA fortalecem alianças como a OTAN, o AUKUS (acordo militar entre EUA, Reino Unido e Austrália) e o Quad (com Japão, Índia e Austrália), todos voltados a conter a influência chinesa no Indo-Pacífico. Essa reconfiguração indica uma nova Guerra Fria — não ideológica, mas tecnológica e econômica.

A guerra tecnológica e a economia do futuro

A disputa pelo domínio tecnológico é um dos principais eixos da nova ordem mundial. Quem liderar setores como inteligência artificial, semicondutores, computação quântica, energia limpa e biotecnologia controlará o futuro da economia e da segurança global.

Os EUA ainda dominam o setor de chips e inovação científica, mas a China investe pesadamente em autossuficiência tecnológica. A guerra comercial iniciada em 2018, com tarifas e restrições sobre empresas como Huawei e TikTok, mostrou que a rivalidade entre Washington e Pequim não é apenas econômica, mas estratégica.

Além disso, a corrida pela energia sustentável redefine o tabuleiro global. O domínio sobre minerais raros (essenciais para baterias e painéis solares) e o desenvolvimento de tecnologias verdes tornam-se prioridades. Nesse campo, a China novamente lidera em produção, enquanto os EUA e a Europa buscam reduzir sua dependência.

Energia, segurança e poder militar

A energia continua sendo um pilar da geopolítica. A Rússia utiliza seu poder energético como ferramenta de pressão, especialmente sobre a Europa. A China investe em fontes renováveis e em rotas alternativas de abastecimento, como o Corredor Econômico China-Paquistão. Os EUA, por sua vez, beneficiam-se de sua autossuficiência energética, impulsionada pelo shale gas.

No plano militar, as três potências intensificam a modernização de seus arsenais. A corrida por armas hipersônicas, drones autônomos e sistemas de defesa cibernética redefine a noção de poder militar. As fronteiras da guerra se expandem para o espaço e o ciberespaço, abrindo novas frentes de disputa.

A OTAN, revigorada após a guerra na Ucrânia, reforça sua presença no Leste Europeu, enquanto a China amplia bases navais no Índico e Pacífico. A Rússia, mesmo sob sanções, demonstra capacidade de resistência e inovação militar, sustentada por décadas de experiência bélica.

O papel da diplomacia e das instituições internacionais

A crise de legitimidade das instituições internacionais — como a ONU, a OMC e o FMI — é um dos sintomas dessa nova ordem. A incapacidade desses organismos de lidar com conflitos e desigualdades econômicas reforça o ceticismo global em relação à governança multilateral.

Enquanto os EUA buscam reformar o sistema mantendo sua liderança, China e Rússia tentam substituí-lo ou criar alternativas. A diplomacia se torna cada vez mais fragmentada: coalizões ad hoc, acordos bilaterais e blocos regionais assumem protagonismo.

A diplomacia chinesa aposta na cooperação econômica e em uma narrativa de “ganha-ganha”, enquanto os EUA defendem a democracia e os direitos humanos como pilares de sua política externa. Já a Rússia adota um discurso de soberania e multipolaridade, criticando o que considera imperialismo ocidental.

América Latina e o Brasil nesse novo cenário

A América Latina, historicamente vista como área de influência dos EUA, ganha importância estratégica na disputa global. A presença crescente da China na região — com investimentos em infraestrutura, mineração e energia — desafia a hegemonia norte-americana. Ao mesmo tempo, a Rússia busca parcerias militares e políticas com países como Venezuela, Cuba e Nicarágua.

O Brasil, maior economia da região, tem papel crucial. Como membro dos BRICS, o país pode atuar como mediador entre blocos, buscando equilíbrio entre pragmatismo econômico e soberania diplomática. Sua capacidade de liderança regional e de interlocução global dependerá da coerência de sua política externa e de sua estabilidade interna.

A disputa das narrativas e a guerra da informação

Além dos campos econômico e militar, a batalha pela influência global também ocorre no campo simbólico. A guerra da informação — travada por meio das redes sociais, da mídia e das plataformas digitais — tornou-se um instrumento de poder.

Os EUA dominam as grandes empresas de tecnologia (Google, Meta, Microsoft), mas a China investe em ecossistemas alternativos (como WeChat e TikTok). A Rússia, por sua vez, utiliza redes de desinformação e propaganda estatal para promover seus interesses e desestabilizar adversários.

A disputa narrativa molda percepções sobre temas como democracia, direitos humanos e soberania. O controle da informação torna-se, assim, um novo campo de batalha geopolítico.

Conclusão: um mundo em transição permanente

A nova ordem mundial não é um sistema estável, mas um processo em constante transformação. A hegemonia americana cede espaço a uma competição entre blocos e modelos distintos de poder. EUA, China e Rússia representam visões diferentes de mundo: o liberalismo democrático ocidental, o autoritarismo tecnocrático chinês e o nacionalismo soberanista russo.

O futuro dependerá da capacidade dessas potências de coexistirem sem colidir. Cooperação em temas globais — como mudanças climáticas, pandemias e segurança cibernética — será fundamental para evitar uma escalada de conflitos.

O mundo caminha para uma multipolaridade complexa, onde alianças serão fluidas e interesses nacionais prevalecerão sobre ideologias. Nesse contexto, países intermediários — como o Brasil, a Índia e a Indonésia — terão a oportunidade de desempenhar um papel cada vez mais relevante, desde que saibam equilibrar suas relações e preservar sua autonomia.